Como a amizade era
vivenciada há uma década? Para responder a esta pergunta, os
que hoje possuem por volta de trinta anos, vão se lembrar muito bem
que os recursos mais utilizados para manter uma amizade eram um
simples telefonema, uma carta, uma visita, um passeio e muitos outros
gestos que simbolizavam afeto, cumplicidade e carinho para com a
outra pessoa.
No
livro O Pequeno Príncipe, escrito
em 1944 por
Antoine
de Saint-Exupéry, vislumbramos um prenúncio dos tempos modernos
quando a raposa suplica ao príncipe que a cative. Ele, no entanto,
responde que não tem tempo, pois tinha amigos e mundos a conhecer.
Ao que ela, sabiamente retruca: “-
A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os
homens não tem tempo de conhecer coisa alguma. Compram tudo
prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens
não têm mais amigos. Se tu queres uma amiga, cativa-me!”
Diferentemente
da geração passada os jovens de hoje, conhecidos como a geração
Y, são nativos digitais e já nasceram em um mundo povoado pela
tecnologia e pela internet. Mais recente ainda, a emergência das
mídias sociais (Twitter, Facebook, chats,
fóruns e blogs) dão
não só aos jovens, mas a todos nós, a possibilidade de utilizá-las
para diversos fins, inclusive para fazer e manter amigos. Mas, será
que, assim como a raposa alertou ao princepezinho,
quantos de nossos fãs, seguidores ou curtidores podem ser
efetivamente chamados de amigos, no sentido estrito
da palavra?
Quantos
daqueles eu cativei ou quantos sequer nem conheço? Sei o nome,
conheço de vista, sei onde trabalha ou quem namora, mas não conheço
a fundo seu íntimo, não sei das suas particularidades, não sei o
que o faz rir ou chorar, o que o move na vida ou quais são seus
sonhos. Quantos, dos 308 amigos que tenho na minha página do
Facebook, posso considerar realmente pessoas do meu círculo íntimo
de convivência? Em uma resposta honesta, posso dizer que
realmente umas
15
pessoas
dessa
lista poderiam receber o título de “amigo”.
Na
atualidade vivemos,
como coloca a filósofa americana Shannon Vallor, o “fast food da
amizade”, com a intangibilidade dos relacionamentos virtuais
mediados por computador, em
que
esses relacionamentos são
fluidos, impalpáveis, na medida que meus amigos virtuais enchem meu
feed de notícias de informações que dizem muito pouco do que
realmente são, o que dificulta uma aproximação verdadeira.
Outros pensadores defendem que os usuários das redes sociais
estariam vivendo uma ilusão de relacionamentos, quando, na verdade,
estariam se isolando do “mundo real” e se afastando das “amizades
verdadeiras”.
Pensemos
também na representação de que cada indivíduo faz de si mesmo nas
redes sociais, com apresentação de um “eu-ideal”, que muitas
vezes não condiz com a realidade. Será que somos sempre lindos,
inteligentes e seguros como nas fotos e mensagens que postamos no
Facebook ou no Twitter? Em que medida não estou mostrando uma
identidade que é muito mais aquilo que eu gostaria de ser do que eu
sou de verdade?
O
mais certo, no entanto, é enxergar que é uma tendência sem
volta. Como no tempo das cavernas, quando vivíamos em grupo e nossa
sobrevivência estava baseada na experiência grupal, hoje com a
comunicação mediada por computador o que se percebe é um caminhar
para um isolamento, em que cada um rompe as barreiras de tempo e
espaço e interage com o amigo do outro lado do mundo sem conhecer e
saber o nome do próprio vizinho. Vivemos
essa
ruptura no conceito de amizade, que significa um relacionamento que
envolve conhecimento mútuo, afeição o que se subtende proximidade
para o estreitamento dos laços. Mas,
não condenemos de antemão as redes sociais, pois as interações e
laços que emergem dali também são passíveis de darem bons frutos.
O que não é aconselhável é ter somente amigos virtuais e não
cultivar a sinceridade dos olhos nos olhos, de uma risada gostosa, de
um toque, um abraço, uma conversa. Afinal, o
que fica da amizade é o conselho da raposa, que esperta como é, nos
deixa para a reflexão a frase “tu
te tornas eternamente responsável por aquilo que cativa.”
Carolina
Lima, Mestranda em Comunicação
na
UFJF.